terça-feira, 12 de agosto de 2008

O dialético Jay Gould versus o neoliberal Dawkins

Em outra ocasião este "sócio-fundador" do blog Molotov que vos escreve (Iskra) já havia polemizado democraticamente com um artigo do companheiro Zé Luís dos Santos, de São Paulo. Foi em novembro de 2007, na postagem Stephen Jay Gould e a religião.

Agora, diante do novo artigo do companheiro publicado no Portal do PSTU, intitulado O ateísmo arrasador de Richard Dawkins, vejo-me na obrigação de voltar à carga contra os delírios do fundamentalismo ateísta.

O artigo do companheiro, no afã de buscar argumentos a favor de sua posição fundamentalista ateísta, comete um erro grave: apelar para um talibã neoliberal apóstolo do individualismo: Richard Dawkins.

Richard Dawkins e
Stephen Jay Gould são considerados dois dos maiores nomes do século XX no estudo sobre a Teoria da Evolução de Charles Darwin. Todavia, os dois evolucionistas travaram durante toda a vida uma batalha intelectual, que reflete em parte suas posições políticas.

Stephen Jay Gould, que sempre simpatizou com o marxismo, e teve uma atuação política como ativista progressista, é o autor da genial Teoria do Equílibro Pontuado, profundamente influenciada pela dialética de Marx.

Já Dawkins, que o companheiro Zé Luis reivindica, é o autor da Teoria do Gene Egoísta, que afirma que a Evolução se baseia em uma tendência genética "natural" de todos os seres vivos à competição individualista (relegando a segundo plano a imensa contribuição das distintas formas de cooperação entre espécies no processo de Evolução).

A Teoria do Gene Egoísta de Dawkins sempre foi utilizada pelos mais reacionários neoliberais como justificativa "científica" para o chamado "darwinismo social", ideologia que afirma que os seres humanos devem competir de forma predatória entre si, a partir de uma perspectiva individualista, deixando de lado qualquer "utopia" socialista ou socializante. O próprio Dawkins, como simpatizante do neoliberalismo, nunca se opôs a esse uso de sua teoria.

Stephen Jay Gould protagonizou um combate sem tréguas à Teoria do Gene Egoísta de Dawkins, à qual nunca deu nenhum crédito. Denunciou ainda a utilização dessa teoria como base das ideologias individualistas neoliberais.

É de se lamentar que alguns companheiros, no desejo desesperado de "provar" a sua suposta verdade de que "não há marxismo conciliável com a crença em entidades sobrenaturais" (nas palavras do próprio artigo), chegem a se valer de teóricos que estão do outro lado da trincheira, como Dawkins, que foi combatido no plano científico por um pensador do porte de Jay Gould, o grande biólogo dialético.

Seis anos após a sua morte, só temos a dizer: Stephen Jay Gould, presente! "Gene egoísta" e Darwinismo social: NÃO PASSARÃO!

4 comentários:

Anônimo disse...

Caro Iskra,

Como leitor mais ou menos assíduo deste blog gostaria de lhe dizer que aprecio sua coragem e sinceridade, e acho muito divertido discutir assuntos polêmicos como esse. Por isso, peço-lhe para que não creia que me vejo de alguma forma irritado pelo tom áspero da discussão.

Gostaria apenas de lhe chamar a atenção para o fato de que a hipótese controversa de Dawkins sobre a evolução, apesar de seu nome popular "o gene egoísta", não tem absolutamente nada a ver com "darwinismo social", e um autor jamais poderá responder pelo uso equivocado que outras pessoas possam fazer de suas idéias.

A hipótese de Dawkins sobre o "gene egoísta" diz apenas que a evolução seleciona os genes mais aptos, e não grupos de indivíduos. É uma diferença sutil. Como toda hipótese científica, deve ser estudada, criticada, refutada ou aprovada em termos estritamente científicos, em que as supostas convicções políticas do autor não valem patavina.

Mas "o gene egoísta" não está em discussão.

Acho que você incorreu num erro de argumentação: em vez de criticar o ateísmo de Richard Dawkins atacou-o por supostas posições políticas. Isso seria o mesmo que dizer:

- Não devemos dar ouvidos a Bertrand Russell, afinal, certa vez ele escreveu um livro liberal-anarquista contra o bolchevismo.

Essa falácia chama-se "ad hominen", o crítico ataca a pessoa de seu oponente, e não seus argumentos.

Por último, não há fundamentalismo nenhum no ateísmo. O ateísmo é, aliás, uma concepção de mundo resultante de muito esforço prático e teórico, ao contrário do fundamentalismo real, que não se esforça nada, apenas crê no que dizem livros supostamente sagrados.

Sobre marxismo e religião: nenhum marxista travará uma luta contra crenças religiosas alheias. Mas a luta contra as religiões é parte do programa de qualquer revolução. Isso significa incendiar as igrejas, depredar divindades, assassinar fiéis de cultos rivais (condutas religiosas típicas)? Não. Significa ganhar os proletários religiosos para uma política proletária justa, mas sem jamais dizer-lhes:

- Continue acreditando em Deus. Nós respeitamos isso.

Isso seria o mesmo que mentir e incentivar a pessoa a manter-se refém de igrejas, pastores e congregações de indivíduos cuja integridade normalmente é, no mínimo, duvidosa.

O perigo das religiões não está na crença em si, mas no uso político contra-revolucionário que o Estado faz delas.

Se Richard Dawkins é um neoliberal, ele deu um tiro no pé com a publicação de "Deus, um delírio", pois o livro mostra de maneira inequívoca como o fundamentalismo cristão norte-americano, apoiado por inúmeras facções de distintas igrejas, poderá dar origem em breve a uma ditadura policial sangrenta o bastante para exterminar os últimos resquícios laicos e democráticos da república.

Carl Sagan, influenciado talvez pelo SU, defendeu a Perestroika, a tática do imperialismo para restaurar o capitalismo na ex-URSS. Nem por isso dizemos:

- Vamos queimar os livros do Carl Sagan, pois ele apoiou a política restauracionista de Gorbatchov!

Ouçamos os cientistas pelo que eles têm a dizer sobre a ciência.

Fico por aqui.

Um abraço!

Zé Luís

Anônimo disse...

Bem, não tinha lido as postagens do Thiago Baptista.

Acho que chovi no molhado...

Zé Luís.

Anônimo disse...

Segue um link para uma entrevista do Richard Dawkins cedida à revista "Veja":

http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=28483

Não vejo como suas posições possam ser retrógradas ou neoliberais, mas isso é secundário. O fato importante é o apelo à ciência e a oposição intransigente à religião, o que caracteriza, aliás, o materialismo na sua forma militante.

[]'s

Zé Luís
zeluis1977@gmail.com

Fernando Deslock disse...

Meus caros, vejo que existe uma necessidade de expor alguns elementos para uma maior analise:

a - Existe duas correntes de pensamento evolutivo: a) saltacionismo (que deu origem ao neutralismo) e o gradualismo (o que deu origem ao selecionismo).

b - Ciências experimentais, como a física, química e biologia, tem métodologia própria e experimental, diferente do que podemos afirmar em sociologia.

Quando oportunistas, como Herbet Spencer, que utilizou dos postulados de Darwin para criar o DARWINISMO SOCIAL, alguns sociólogos como GILBERTO FREYRE resolveram encarar o Lamarkismo a melhor teoria, pois a lei do uso e desuso estaria de melhor conformidade dos textos que produz. É notório que nesta época que Freyre escreveu CASA GRANDE E SENZALA era típico a existência de grupos que defendiam a eugenia (uma aberração ideológica feita por gente que achavam que tinham entendido o que Darwin tinha escrito).

Atribuir o título neoliberal a Dawkins é, em suma, imaturidade intelectual, o desconhecimento da matéria e da obra do mesmo. Se os genes em si são considerados as unidades fundamentais e funcionais da evolução e que eles se comportam de maneira egoísta, serve de pretesto pra afirmar que ele está sendo um dos teóricos embasadores desta nefasta ação do capitalismo contra os povos de países subdesenvolvidos?

O que vem a ser fundamentalismo ateísta? Dawkins, em sua obra, mostrou-se incoerente e prolixo em relação ao ateísmo? Um ateu coerente respeita o seu direito de ter uma religião, porém é combativo no que diz respeito quando opiniões derivadas de pensamentos religiosos interfiram com opiniões públicas (tal como José Serra não poupou nesta campanha politica).

Se o neoliberalismo utiliza de teoria de dawkins, pq então eles não combatem o criacionismo e o design inteligente? As espécies realmente não contribuem umas com as outras no processo de evolução... lembre-se que o objetivo da evolução é sobreviver em um ambiente a ponto de produzir uma descendência viável e dar continuidade a espécie. Porém, as espécies podem criar variações e estas variações continuarem a existir por não ocorrer a pressão de seleção. Na minha opinião, o selecionismo e o neutralismo são fenômenos biológicos complementares.

Recomendo amigo, que leia mais sobre Dawkins e Stephen Jay Gould, ambos expoentes da atualidade no que diz respeito a biologia evolutiva.

Abraços e espero que tenha uma leitura proveitosa