Mais um excelente artigo de Robert Fisk sobre a questão do Oriente Médio publicado no The Independent. Desta vez o assunto é a forma como será tratada o primeiro massacre do governo Obama. Vale a leitura.
Na guerra que vem dos céus, os civis pagam o preço
Robert Fisk
Claro que haverá uma 'investigação'. Enquanto isso nos dirão que todos os civis mortos no Afeganistão estariam sendo usados como "escudos humanos" pelos taliban. E todos "lamentaremos profundamente" as vidas humanas sacrificadas. Mas sempre alguém dirá que a culpa foi dos terroristas, não dos heróicos pilotos das Forças Especiais da Marinha dos EUA que faziam tiro ao alvo nos arredores de Bala Baluk e Ganjabad.
Quando os norte-americanos destroem casas de iraquianos, sempre há uma investigação. E ah! Como os israelenses adoram investigações! (Mesmo que só raramente alguém seja informado de alguma coisa). Essa é a história do moderno Oriente Médio.
Os ocidentais sempre têm razão e, quando não temos, nós (às vezes) "lamentamos profundamente" e, em seguida, jogamos a culpa de tudo sobre "terroristas". Claro. Todo mundo sabe que cortadores de gargantas e degoladores e suicidas-bomba estão bem preparados para sacrificar inocentes.
Mas – e indício de o quanto foi terrível o massacre de afegãos ontem –, o impotente presidente Hamid Karzai falou como ícone de bondade ontem, e conclamou a buscar "uma plataforma superior de moralidade" numa guerra feroz; que todos fizessem guerra "como seres humanos melhores".
Claro. O argumento é bem simples: nós vivemos; eles morrem. Não arriscamos nossos valorosos soldados no chão – nem para proteger os civis. Nem por coisa alguma.
Choveram bombas de fósforo sobre Fallujah. Houve fogo cerrado, de tanques, em Najaf. Sabemos que estamos matando inocentes.
É exatamente o que Israel sempre fez e faz. Israel disse o que ontem disse Clinton, também depois de seus aliados terem massacrado 1.700 civis nos campos de refugiados de Sabra e Chatila em 1982; e também depois da morte de milhares de civis no Líbano em 2006; e também depois da morte de mais de mil palestinos em Gaza, esse ano.
E se ao mesmo tempo matamos alguns homens armados – "terroristas", claro –, é sempre a mesma velha tática dos "escudos humanos" e, em resumo, a culpa sempre é dos "terroristas". As táticas militares de EUA e Inglaterra estão agora perfeitamente alinhadas às táticas militares de Israel.
A verdade é que a lei internacional proíbe que exércitos ataquem com armamento pesado áreas densamente povoadas e que bombardeiem vilas e pequenos aglomerados humanos – mesmo que haja inimigos nessas áreas.
Claro. Todas essas leis foram-se pelo ralo, quando EUA e Inglaterra bombardearam o Iraque em 1991; e a Bósnia; e na guerra da Otan na Sérvia; e na aventura ocidental no Afeganistão em 2001; e, em 2003, no Iraque.
E sempre houve investigações. E sempre houve "escudos humanos". E terror, terror, terror.
E há mais um detalhe a observar: inocentes ou "terroristas"; civis ou taliban... Os culpados, em todos os casos, sempre são muçulmanos.