É absolutamente insustentável a proposta de dobrar o mínimo já em 2011, ou em qualquer ano vindouro. Enquanto admirador distante do partido, devo alertá-los do peso demagógico que uma tal proposta carrega; assim como a base governista e a oposição, o PSTU está tentando fazer da questão do mínimo um centro gravitacional de atração da classe trabalhadora. Sinto, entretanto, que esse tipo de estratégia é um tiro no pé; a classe trabalhadora não só é profundamente conservadora, na medida em que incorpora acriticamente a ideologia da burguesia brasileira, como acha-se, em razão disso, realista. Há no Brasil (e não só no Brasil, evidentemente) a crença generalizada de que qualquer aumento no salário mínimo, que não encontre contrapartida na expansão da economia, gera desequilíbrios no auto-ajustamento do mercado (sobretudo, a temida inflação) e, consequentemente, crise. A classe trabalhadora compartilha dessa ideologia liberal com os próprios liberais. Assim, utilizar o mínimo como estratégia de agitação e coligação da classe trabalhadora se mostra, na minha opinião, inócua, quando não contraprodutiva. Mas, de fato, será que a discussão sobre o mínimo pode ser balizada apenas por parâmetros ideológicos? É evidente que não. Dentro do sistema capitalista, como todos nós sabemos, o mínino está determinado: 1) pelo valor de reprodução da força de trabalho; 2) pela concorrência (tanto entre a mercadoria força de trabalho, quanto pelos produtos necessários à reprodução dessa mercadoria) e pela oferta e procura (que determinam o preço); 3) e por condições culturais e políticas. Os dois primeiros aspectos são determinantes, posto que as condições culturais e políticas estão sujeitas às flutuações do movimento do capital. Portanto, é o mercado e o movimento do capital no seu processo de autoreprodução ampliado que determinam o valor e o preço da força de trabalho (o salário mínimo). Do que foi dito, conclui-se necessariamente que o Estado detém pouco margem de ação para determinar esse salário mínimo. Seu papel na definição do mínimo está baseado no movimento do capital (no desenvolvimento da indústria, do comércio e dos serviços, da agroindústria, das exportações e importações, do setor financeiro etc.) e deve, forçosamente, se pautar neste movimento. Logo, é evidente que um aumento exagerado do mínimo, motivado por objetivos políticos e não econômicos, levaria sim à desestabilização da economia nacional. Um aumento para R$ 1.020,00 simplesmente não encontraria correspondência no mercado. Suas consequências seriam imprevisíveis, mas certamente levariam à estagflação e ao desemprego. Um aumento de quatro vezes o salário atual, então, proposta defendida pelo DIEESE, é ainda mais absurdo. O cálculo do DIEESE baseia-se em condições ideais: na atual situação econômica do país, dois mil e tantos reais seria, para o DIEESE, o valor mínimo para satisfazer as necessidades básicas dos cidadãos, tal como consta e exige a Constituição. É óbvio, para qualquer socialista consequente, que a garantia dessas necessidades só poderá ocorrer numa sociedade socialista, jamais dentro de um sistema social capitalista.
Não me entendam mal, não estou aqui defendendo a pseudociência econômica liberal, presa das mais fetichizadoras ideologias; tampouco defendo a política econômica e social do governo PT, que se diz governar para todos mas, em verdade, nunca antes na história desse país governou-se tanto para os ricos. Entretanto, a política defendida pelo PSTU, no que tange ao salário mínimo, é não apenas irreal, como entra em contradição com o projeto de uma sociedade socialista. Adotar esse tipo de política, além de reacir na demagogia, contribui para corromper a mentalidade da classe trabalhadora, na medida em que incentiva o consumo exacerbado e individual e, no limite, espalha a crença de que o sistema do capital funcionaria, se fizéssemos alguns ajustes dentro da ordem. É claro que um aumento maior do mínimo é tangível mesmo com essas considerações em mente. Mas não creio que seja este o foco central ao qual um projeto político-partidário socialista deveria se ater. A distribuição relativa da renda dentro da ordem socioeconômica atual deve ser feita via Estado (jamais via mercado), não por políticas assistencialistas ou de parcerias público-privadas (esta sendo, ao contrário, política de concentração de renda, posto que transfere verba pública para a iniciativa privada, gerando novos mercados para o capital), mas pelo investimento maciço no ensino público, na saúde, na infra-estrutura (estradas, portos, energia, saneamento etc.), único meio, dentro do capitalismo, para reverter parte do capital acumulado pela exploração da força de trabalho em favor dos próprios trabalhadores.
Ô Grabriel "Dicionário Aurélio", me responde uma coisa: segundo seu raciocínio, o PSTU não deveria defender as bandeiras da luta contra a homofobia e contra o machismo, uma vez que a classe trabalhadora é conservadora (concordo) e, assim, é bizonhamente machista e homofóbica. Procede?
Fala aí, Tiago. Quando disse que a mentalidade da classe trabalhadora é reacionária (tanto quanto qualquer outra classe ou grupo social brasileira), me referia ao problema da transformação revolucionária da ordem social. Quanto a isso não tenha dúvida: os trabalhadores, em sua esmagadora maioria, não acreditam na viabilidade de uma revolução, tomam o capitalismo como destino inevitável da humanidade, compram a ideologia burguesa do "fim da história" etc. O problema consiste em como um partido de vanguarda deve trabalhar para desenvolver uma consciência de classe que se oriente para além do capitalismo, para um possível socialismo futuro. Já os preconceitos de cor e gênero são outros quinhentos, embora estejam, no limite, inevitavelmente ligados à condição imposta pela sociedade divida em classes. O machismo e o homofobismo, que você cita como exemplo mas as quais poderíamos também ajuntar o xenofobismo, o racismo etc., estão muito mais determinados por questões culturais, que atravessam todas as classes, ainda que, como eu disse, tenham suas raízes mais profundas no modo de produção social capitalista. Tratar essas questões sem cair no sectarismo dos movimentos sociais é bastante complicado. Acredito que elas devam ser tratadas à luz da luta de classes, sempre remetidas à totalidade da vida social, e não tratadas isoladamente como problemas a parte. Deve-se estabelecer sempre aí um recorte classista. E esse é um dos problemas dos movimentos sociais não-fundados na classe. Por exemplo: na luta pelo fim do machismo, vamos misturar mulheres ricas e pobres num mesmo movimento? Exploradoras e exploradas juntando forçsa com o fito de combater um mal comum? Não acredito nisso, e também não levantaria a bandeira das feministas ricas em favor do fim do machismo. Levantaria a bandeira das feministas pobres contra o machismo e contra as feministas ricas que as exploram. O recorte de classes é necessario, portanto, para que não caíamos no equívoco dos movimento sociais, que pretendem acabar com o fim da opressão e do preconceito sem acabar com as classes.
Realmente, nos dicionários há essa "vista grosssa". Mas vamos analisar:
- Uma mulher internada num hospital é uma "pacienta"? - Uma mulher que é bastante cuidadosa é "prudenta"? - Uma mulher com graves problemas cerebrais se torna "dementa"? - Uma mulher que gerencia uma loja é uma "gerenta"? - Uma companheira celebrada por sua vida revolucionária está "presenta"?
7 comentários:
É absolutamente insustentável a proposta de dobrar o mínimo já em 2011, ou em qualquer ano vindouro. Enquanto admirador distante do partido, devo alertá-los do peso demagógico que uma tal proposta carrega; assim como a base governista e a oposição, o PSTU está tentando fazer da questão do mínimo um centro gravitacional de atração da classe trabalhadora. Sinto, entretanto, que esse tipo de estratégia é um tiro no pé; a classe trabalhadora não só é profundamente conservadora, na medida em que incorpora acriticamente a ideologia da burguesia brasileira, como acha-se, em razão disso, realista. Há no Brasil (e não só no Brasil, evidentemente) a crença generalizada de que qualquer aumento no salário mínimo, que não encontre contrapartida na expansão da economia, gera desequilíbrios no auto-ajustamento do mercado (sobretudo, a temida inflação) e, consequentemente, crise. A classe trabalhadora compartilha dessa ideologia liberal com os próprios liberais. Assim, utilizar o mínimo como estratégia de agitação e coligação da classe trabalhadora se mostra, na minha opinião, inócua, quando não contraprodutiva.
Mas, de fato, será que a discussão sobre o mínimo pode ser balizada apenas por parâmetros ideológicos? É evidente que não. Dentro do sistema capitalista, como todos nós sabemos, o mínino está determinado: 1) pelo valor de reprodução da força de trabalho; 2) pela concorrência (tanto entre a mercadoria força de trabalho, quanto pelos produtos necessários à reprodução dessa mercadoria) e pela oferta e procura (que determinam o preço); 3) e por condições culturais e políticas. Os dois primeiros aspectos são determinantes, posto que as condições culturais e políticas estão sujeitas às flutuações do movimento do capital. Portanto, é o mercado e o movimento do capital no seu processo de autoreprodução ampliado que determinam o valor e o preço da força de trabalho (o salário mínimo). Do que foi dito, conclui-se necessariamente que o Estado detém pouco margem de ação para determinar esse salário mínimo. Seu papel na definição do mínimo está baseado no movimento do capital (no desenvolvimento da indústria, do comércio e dos serviços, da agroindústria, das exportações e importações, do setor financeiro etc.) e deve, forçosamente, se pautar neste movimento. Logo, é evidente que um aumento exagerado do mínimo, motivado por objetivos políticos e não econômicos, levaria sim à desestabilização da economia nacional. Um aumento para R$ 1.020,00 simplesmente não encontraria correspondência no mercado. Suas consequências seriam imprevisíveis, mas certamente levariam à estagflação e ao desemprego. Um aumento de quatro vezes o salário atual, então, proposta defendida pelo DIEESE, é ainda mais absurdo. O cálculo do DIEESE baseia-se em condições ideais: na atual situação econômica do país, dois mil e tantos reais seria, para o DIEESE, o valor mínimo para satisfazer as necessidades básicas dos cidadãos, tal como consta e exige a Constituição. É óbvio, para qualquer socialista consequente, que a garantia dessas necessidades só poderá ocorrer numa sociedade socialista, jamais dentro de um sistema social capitalista.
Não me entendam mal, não estou aqui defendendo a pseudociência econômica liberal, presa das mais fetichizadoras ideologias; tampouco defendo a política econômica e social do governo PT, que se diz governar para todos mas, em verdade, nunca antes na história desse país governou-se tanto para os ricos. Entretanto, a política defendida pelo PSTU, no que tange ao salário mínimo, é não apenas irreal, como entra em contradição com o projeto de uma sociedade socialista. Adotar esse tipo de política, além de reacir na demagogia, contribui para corromper a mentalidade da classe trabalhadora, na medida em que incentiva o consumo exacerbado e individual e, no limite, espalha a crença de que o sistema do capital funcionaria, se fizéssemos alguns ajustes dentro da ordem.
É claro que um aumento maior do mínimo é tangível mesmo com essas considerações em mente. Mas não creio que seja este o foco central ao qual um projeto político-partidário socialista deveria se ater. A distribuição relativa da renda dentro da ordem socioeconômica atual deve ser feita via Estado (jamais via mercado), não por políticas assistencialistas ou de parcerias público-privadas (esta sendo, ao contrário, política de concentração de renda, posto que transfere verba pública para a iniciativa privada, gerando novos mercados para o capital), mas pelo investimento maciço no ensino público, na saúde, na infra-estrutura (estradas, portos, energia, saneamento etc.), único meio, dentro do capitalismo, para reverter parte do capital acumulado pela exploração da força de trabalho em favor dos próprios trabalhadores.
Ô Grabriel "Dicionário Aurélio", me responde uma coisa: segundo seu raciocínio, o PSTU não deveria defender as bandeiras da luta contra a homofobia e contra o machismo, uma vez que a classe trabalhadora é conservadora (concordo) e, assim, é bizonhamente machista e homofóbica. Procede?
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E por falar em Aurélio, coé, galera do Molotov, "presidenta" não existe. :P
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Engraçado Thiago...
Meu dicionário deve ser diferente do seu:
Significado de Presidenta
s.f. Mulher que exerce função de presidente.
:)
Fala aí, Tiago. Quando disse que a mentalidade da classe trabalhadora é reacionária (tanto quanto qualquer outra classe ou grupo social brasileira), me referia ao problema da transformação revolucionária da ordem social. Quanto a isso não tenha dúvida: os trabalhadores, em sua esmagadora maioria, não acreditam na viabilidade de uma revolução, tomam o capitalismo como destino inevitável da humanidade, compram a ideologia burguesa do "fim da história" etc. O problema consiste em como um partido de vanguarda deve trabalhar para desenvolver uma consciência de classe que se oriente para além do capitalismo, para um possível socialismo futuro. Já os preconceitos de cor e gênero são outros quinhentos, embora estejam, no limite, inevitavelmente ligados à condição imposta pela sociedade divida em classes. O machismo e o homofobismo, que você cita como exemplo mas as quais poderíamos também ajuntar o xenofobismo, o racismo etc., estão muito mais determinados por questões culturais, que atravessam todas as classes, ainda que, como eu disse, tenham suas raízes mais profundas no modo de produção social capitalista. Tratar essas questões sem cair no sectarismo dos movimentos sociais é bastante complicado. Acredito que elas devam ser tratadas à luz da luta de classes, sempre remetidas à totalidade da vida social, e não tratadas isoladamente como problemas a parte. Deve-se estabelecer sempre aí um recorte classista. E esse é um dos problemas dos movimentos sociais não-fundados na classe. Por exemplo: na luta pelo fim do machismo, vamos misturar mulheres ricas e pobres num mesmo movimento? Exploradoras e exploradas juntando forçsa com o fito de combater um mal comum? Não acredito nisso, e também não levantaria a bandeira das feministas ricas em favor do fim do machismo. Levantaria a bandeira das feministas pobres contra o machismo e contra as feministas ricas que as exploram. O recorte de classes é necessario, portanto, para que não caíamos no equívoco dos movimento sociais, que pretendem acabar com o fim da opressão e do preconceito sem acabar com as classes.
Realmente, nos dicionários há essa "vista grosssa". Mas vamos analisar:
- Uma mulher internada num hospital é uma "pacienta"?
- Uma mulher que é bastante cuidadosa é "prudenta"?
- Uma mulher com graves problemas cerebrais se torna "dementa"?
- Uma mulher que gerencia uma loja é uma "gerenta"?
- Uma companheira celebrada por sua vida revolucionária está "presenta"?
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