O jornal A Tribuna publicou em sua edição de hoje uma entrevista com Zé Maria, nosso pré-candidato à presidência da república. O conteúdo completo da entrevista está no blog de política do jornal, o “Nos corredores do poder”. Aproveitamos para publicá-lo aqui com uma pequena correção: Segundo o jornal, ao ser perguntado pelo programa, Zé Maria teria respondido que o “pagamento das dívidas” faria parte do mesmo quando o correto é exatamente o “não pagamento”. Obviamente um erro de grafia do jornal, mas de toda forma segue a entrevista com a correção.
Zé Maria, presidenciável do PSTU
José Maria de Almeida é metalúrgico, tem 52 anos, pai de Gabriel, de 12, e é candidato a presidente da República. Talvez você lembre dele da propaganda eleitoral na TV. Ele se apresenta como Zé Maria e disputou esse cargo outras duas vezes, em 1998 e em 2002, quando entoou o bordão do partido: “Contra burguês, vote 16”.
16 é o número do Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU). A legenda nasceu em 1994 e tem, entre os fundadores, vários ex-petistas, descontentes com os rumos do partido da estrela vermelha. Zé Maria conhece bem o presidente Lula. Ficou preso com ele, na década de 70.
O presidenciável esteve em Santos no fim de semana participando do Congresso da Classe Trabalhadora (Conclat).
Por que não ocorreu a coligação do PSTU com outros partidos de esquerda?
Nós queríamos fazer. Propusemos desde agosto do ano passado, mas não conseguimos um acordo sobre o programa e sobre o critério de financiamento de campanha. Quando o PSOL procurou a Marina Silva (PV) para fazer coligação no ano passado, sinalizou para nós uma discordância de programa muito grande. Porque, para nós, a candidatura implica na defesa de um programa socialista para o País. E a Marina defende a continuidade do modelo econômico que está aí, como ela diz reiteradas vezes.
Mas no passado o PSTU apoiou o PSOL...
Fizemos a coligação com o PSOL porque construímos um acordo programático que era aceitável para os dois partidos. Então, na medida em que a Marina não aceitou fazer a aliança com o PSOL, retomamos o debate sobre o programa, mas a decisão do PSOL, que lançou agora a pré-candidatura do Plínio de Arruda Sampaio, é diferenciada do programa que o PSTU defende.
E qual é esse programa?
Nós achamos que um programa socialista pressupõe não pagar a dívida interna e externa, estatizar os bancos e o sistema financeiro, estatizar as grandes empresas, romper com o Fundo Monetário Internacional (FMI), estatizar o latifúndio, o agronegócio, as empresas que exploram os recursos naturais do País como a Vale do Rio Doce e reestatizar a Petrobras, porque ela vem sendo privatizada. São medidas que, na nossa opinião, são essenciais para que os recursos que o Brasil tem e a riqueza produzida pelo trabalho possam ser utilizados para atender a necessidade do povo. Sem isso, não muda o Brasil. E o pessoal acha que essas medidas são radicais demais. Vão no contrassenso do senso comum das pessoas. E há razão nisso. Vão mesmo. Só que eles valorizam muito essa relação com o senso comum para eleger o deputado. Nós também queremos eleger deputados, mas sem deixar de dizer a verdade para as pessoas. Hoje não temos deputados porque priorizamos esse tipo de campanha, para dizer o que o Brasil precisa fazer para mudar e o que o povo tem que fazer para que essa mudança ocorra.
O fato de o PSTU não receber dinheiro de empresas para a campanha ajudou a afastar aliados?
Esse é outro tema fundamental da nossa campanha. Não aceitamos dinheiro de empresas. Fazemos a campanha com a contribuição da própria militância, de trabalhadores e de jovens que concordam com o PSTU. Obviamente fazendo uma campanha muito mais modesta do que a deles. Nossa campanha não vai custar R$ 250 milhões, que os comandos do PT e do PSDB estão dizendo que vão custar suas campanhas. Vai custar, provavelmente, R$ 250 mil. É o que vamos conseguir arrecadar. Nós dependemos da ajuda dos trabalhadores, que não têm dinheiro para ficar gastando em campanha eleitoral.
Como o senhor analisa os gastos das outras campanhas?
O José Serra também não tem R$ 250 milhões para gastar. Nem a Dilma Rousseff. Como eles recolhem esse dinheiro? Eles recolhem com os bancos, com as empreiteiras, com as grandes empresas. E depois, quando ganham, governam para quem? Para os bancos, para as empreiteiras. Por isso que nós não aceitamos esse tipo de doação.
O governo, então, começa na campanha?
Sim. Os empresários fazem um investimento. Eles pagam a campanha do candidato e, depois, a autoridade eleita governa para eles, e não para o povo.
O senhor citou algumas ideias que muitos leram nos livros, quando estudaram. o que, de novo, o socialismo apresenta?
O problema é que essas mudanças são a base de uma sociedade igualitária que o País precisa. Infelizmente nunca tivemos isso no nosso País. Nosso País é a oitava economia do mundo, deve ser a quinta economia do planeta. É muito rico. Tem plenas condições de prover tudo que o povo precisa para ter uma vida digna, mas nós vivemos nessa condição de desigualdade. A primeira condição para mudar é exatamente isto: abolir a propriedade privada, colocar os recursos e a riqueza do País a serviço das necessidades do povo. A segunda fundamental tem a ver com a forma de governar.
E como deve ser?
Não pode ser como se governa agora, com deputados, governadores e presidente sendo eleitos financiados pelos bancos. Nós temos que construir instituições para o povo governar o Brasil. E é o povo governando o Brasil que vai criar as condições para mudar o País. Queremos levar para o processo eleitoral essa ideia. A classe trabalhadora brasileira acalentou, no final da década de 70, com a construção do PT, com a projeção do Lula, o sonho que ela poderia governar o Brasil. E governando o Brasil, mudar a prioridade, fazer com que no País a prioridade fosse o povo, e não o banqueiro. O Lula, para chegar ao Governo, abandonou essa ideia e fez um acordo com os bancos, com as grandes empresas e está fazendo um governo que mantém as mesmas prioridades de antes. Nós queremos resgatar aquele sonho da classe trabalhadora governando o País não com o banqueiro, mas contra ele.
O PSTU não reconhece avanços nos programas sociais do Governo Lula?
Não. Vou te dar dois exemplos, que o Governo mesmo costuma apontar como pontos fortes: o salário mínimo aumentou 57% em sete anos e meio, o Lula apresenta isso como grande vantagem. Nós não achamos que seja. Por que? Porque o lucro das grandes empresas, nesse mesmo período, aumentou 400%. Os bancos aumentaram a rentabilidade em 850%. Pergunto para você: por que o salário mínimo não aumentou 850%, ao invés de 57%? Porque a prioridade, na alocação da riqueza que o Brasil produziu nesses anos, foi para o banco. Esse é o resultado da política que o Lula aplicou. Veja o Bolsa Família: o Governo se orgulha, se apresenta no mundo todo como campeão do combate à pobreza. O Bolsa Família atende 12 milhões de pessoas e gasta R$ 12 bilhões, R$ 13 bilhões por ano. São 44 milhões de brasileiros que dependem disso. O Bolsa Família é uma ajuda, que varia de R$ 90,00 a R$ 130,00, para que uma família viva. O Lula gasta mais de R$ 130,00 por dia, com ele só. Como ele quer que uma família viva com R$ 130,00 por mês? O Brasil é um País rico, poderia e deveria assegurar a essas famílias emprego, salário digno, moradia digna, acesso à saúde, à educação pública. É isso que essas famílias merecem e não R$ 130,00 por mês. E o Brasil pode atender a essas necessidades se deixar de priorizar as empresas. O Governo está ajudando as fábricas de carro do País a vender desde o final de 2008. São algumas das fábricas mais ricas do mundo, que recebem recursos públicos.
O senhor falou da necessidade de reestatizar a Petrobras, mas hoje os indicadores internacionais a apontam como uma das principais empresas do mundo. com maior controle governamental, ela não pode perder competitividade?
Não. Ela vai ser maior do que é. A riqueza de petróleo que nosso País tem é enorme. Agora com o pré-sal, mais ainda. Qual o problema? Os donos da Petrobras hoje são os fundos de investimento dos Estados Unidos. Mais de 40% das ações são negociadas lá e eles controlam a administração da empresa. É uma empresa riquíssima, que funciona em função de que? Para alocar essa riqueza para atender as necessidades do povo? Não. É para mandar lucro para Nova Iorque, para os fundos de investimentos, que são os donos das ações da empresa. A discussão hoje no Congresso Nacional é sobre os royalties. O que vamos fazer com os royalties? Vão para o Rio de Janeiro? Vão ser distribuídos para todo o País? São 5% da renda do petróleo que eles estão discutindo. E os outros 95%? Vão continuar sendo apropriados pelos acionistas da Petrobras? Ou são do povo brasileiro? Nós achamos que têm de ser do povo brasileiro 100% da renda do petróleo. Para isso, a empresa precisa ser estatal. Para isso, ela não pode ser administrada em consonância com os interesses dos fundos de investimentos americano. Tem de ser administrada em função dos interesses brasileiros.
Esse discurso vale para outras empresas?
Vamos ter de reestatizar a Vale do Rio Doce. Os minérios que a Vale explora em nosso País são de importância estratégica ilimitada. A empresa lucra mais de R$ 20 bilhões por ano. Vai para onde esse dinheiro? Para os mesmos fundos de investimentos que são donos da Petrobras, que são os donos das ações da Embraer. A riqueza produzida aqui é remetida lá para fora.
Uma das propostas do PSTU é para que a população escolha os representantes do judiciário e da polícia. O senhor acha que o Brasil está maduro para essas medidas?
Eu acho que o Brasil não pode suportar mais a bandalheira que são os sistemas policial e judiciário do País. O crescimento e a predominância do narcotráfico e do crime organizado na vida social das periferias das grandes cidades seria impossível sem a conivência da polícia ou do Judiciário. Impossível. Todos os dias surgem escândalos. É justamente essa estrutura antidemocrática que permite essa situação. A população toda é vítima de uma violência infernal, e a nossa juventude, que mora na periferia, ora é vítima da violência do narcotráfico, ora é vítima da violência da própria polícia, que entra na favela atirando e matando as pessoas só porque são negras e pobres. Isso é inaceitável. Isso só existe porque ninguém controla a polícia. Ou, quando controla, é o próprio narcotráfico que controla. Tem que mudar. A mesma coisa o Judiciário. Como o juiz se dá o direito de decidir as coisas que decide, sempre a favor do rico, sem que ninguém possa contestar? Por que? Nós achamos que tem que mudar. A Justiça é um dos serviços mais importantes que a população tem de ter acesso.
O senhor conheceu bem o Lula, na década de 70. Qual a principal mudança do Lula da década de 70 e hoje, como presidente da República?
Estivemos presos juntos. Ideologicamente, com franqueza, o Lula sempre isso que ele é hoje. Na cabeça dele, desde aquela época, ele queria ser presidente da República. Ele nunca teve compromisso com mudança, de fundo, da estrutura econômica e social do País. Quando a gente perguntava para ele, naquela época: você é marxista? Você é socialista? Ele brincava: eu sou torneiro mecânico. Que é uma forma de desqualificar a experiência histórica da classe trabalhadora e o debate político. Ficava fazendo brincadeira para não assumir nenhum compromisso de conteúdo. Ele, naquele momento, lutava ao lado dos trabalhadores porque estava vinculado ao processo de lutas. Isso mudou. Ele se afastou do processo e, para poder realizar o sonho de ser presidente da República, ele fez aliança com o grande empresariado e com os banqueiros. E está fazendo um governo para os grandes empresários e banqueiros, virando as costas para aquilo que era o sonho dos trabalhadores que o elegeram, que era mudar o País, inverter a prioridade nesse País. Isso o Lula ignora solenemente hoje.
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